segunda-feira, 24 de março de 2008

Bons conselhos duma mãe agradecida*

Logo depois de ter lido aqueles documentos sobre a avaliação dos professores, pensei como lhe deveria agradecer, Srª Ministra.
Afinal, aquelas horas passadas diariamente junto do meu filho a verificar se os cadernos e as fichas estavam bem organizados, a preparar a mochila e as matérias a estudar para o dia seguinte, a folhear a caderneta escolar, a analisar e a assinar os trabalhos e os testes realizados nas muitas disciplinas, a curar a inflamação de uma garganta dorida pela voz de comando "Vai estudar!" ou pela frase insistentemente repetida, de 2ª a 6ª feira:"DESPACHA-TE! AINDA CHEGAS ATRASADO!" ou o incómodo e o tempo perdido para o levar diariamente à Escola, percorrendo, mais cedo do que seria necessário, um caminho contrário àquele que me conduziria ao meu emprego, tinham finalmente, os seus dias contados. Doravante, essa responsabilidade passaria para a Escola e, individualmente, para cada um dos seus professores.
Finalmente, poderei ir ao cinema, dar dois dedos de conversa no Café do Sr. Artur, trocar umas receitinhas com a minha vizinha (está entrevadinha, coitadinha!) ou acomodar-me deliciosamente no sofá da sala a ver a minha telenovela brasileira preferida. O rapaz ainda me alertou para os efeitos das faltas o conduzirem à realização de uma prova de recuperação. Fiz contas e encolhi os ombros - poupo gasóleo e muitos minutos de caminho, de tráfego e de ajuntamentos. Afinal, ele até é esperto e, se calhar, na internet, encontra alguns trabalhos ou testes já feitos… Sempre pode fazer "copy – paste"… Efectivamente, as provas de recuperação parecem-me a melhor solução para acabar com a minha asfixia matinal e vespertina.
Ontem, a minha vizinha da frente, que tem dois ganapos na escola do meu, disse-me que, se ele continuar a faltar, o vêm buscar a casa, e que, no próximo ano lectivo, os professores vão tomar conta deles depois das aulas. Oiro sobre azul.
Obrigada, Srª Ministra. A Senhora é que percebe desta coisa de ser mãe! A Senhora desculpe a minha ousadia, mas será que também não seria possível fazer uma lei para os miúdos poderem ficar a dormir na escola? Bastava mandar retirar as mesas e cadeiras das salas de aula e substituí-las por beliches, à noite. De manhã, era só desmontar e voltar a arrumar. Têm bar, cantina e até duche. Com jeito, eles ainda aprendiam alguma coisinha sobre tarefas domésticas, porque, em casa, não os podemos obrigar a fazer nada ou somos acusados de exploradores do trabalho infantil com a ameaça dos putos ainda poderem apresentar queixa junto das autoridades policiais.
Ao Sábado, Srª Ministra, podiam ocupá-los com actividades desportivas ou de grupo, teatro, catequese, escuteiros, defesa pessoal…O ideal mesmo era que os pudéssemos ir buscar ao Domingo, só para não se esquecerem dos rostos familiares.
O meu medo, Srª Ministra, é aquela ideia que a minha vizinha Sandrinha, aquela dos três ganapos, comentava hoje comigo. Dizia-me que a Senhora Ministra quer criar o ensino doméstico. Eu acho que ela deve ter ouvido mal ou então confundiu o jornal da SIC com aquele programa da troca de casais do canal 24. Eu acho que isso não vinga em Portugal, porque não temos a extensão de uma América do Norte ou de uma Austrália e, por outro lado, tinha que comprar e equipar os VEI (veículos de educação itinerante), o que iria agravar mais o deficit das contas públicas e o insucesso dos nossos miúdos. Foi isso eu disse à Sandrinha. Acho que ela deve estar enganada. Logo agora, que podemos respirar de alívio porque não temos que nos preocupar com a escola dos garotos, essa ideia vinha destruir tudo, porque os obrigava a ficar em casa para receberem os VEI e aos pais ainda iria ser exigido algum acompanhamento.
A Senhora faça é aquilo que decidiu e não oiça o que os inimigos dos pais e das mães lhe tentam dizer (já agora, lembre-se da minha sugestãozita!). Assim, os professores, com medo da sua própria avaliação, passam a dar boas notas e a passar todos os miúdos e, desta forma, o nosso país varre o lixo para debaixo do tapete, porque é muito feio e incomodativo mostrarmos, lá fora, que somos menos capacitados que os nossos "hermanos" europeus.
Uma mãe e encarregada de educação agradecida,

*Teresa Pimenta
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Notas: 1 - Avisa-se a senhora socióloga que esta carta está cheia de ironia; o aviso serve também para os seus "cães de fila", obedientes e acríticos, à espera do "osso"; ela e eles podem perguntar a qualquer professor o que significa ironia; 2 - Já há tempos que este texto circula entre blogues; foi-me enviada por mão amiga, pedindo a sua publicação; aqui a deixo, principalmente para quem ainda a não leu; e também não faz mal relê-la, já que o seu conteúdo permanece actual.

2 comentários:

Anónimo disse...

Excelente-é a minha avaliaçao.

TempoBreve disse...

Sim. Esta carta toca em pontos essenciais:
- Os pais não podem abdicar da responsabilidade que têm perante a educação dos seus filhos, atirando simplisticamente com essa tarefa para a escola;
- Os pais não podem aceitar ser tratados com uma menoridade indigente, aceitanto que insinuem que eles só querem é que lhes "ocupem" os filhos seja de que maneira for;
- Os pais nãp podem aceitar que a escola e os professores sejam obrigados a demitir-se da sua principal função que assenta as suas raízes no "Ensinar e Aprender", e não em actividadezinhas de entretenimento enganoso.
Um abraço.