quarta-feira, 5 de março de 2008

Assumir responsabilidades

Os professores do Departamento de Línguas e Literaturas, da Escola Secundária D. Maria II, Braga, na sua reunião ordinária de hoje, 5 de Março, abordaram, inevitavelmente, o modelo de avaliação que nos querem impor. Após demorada, participada e viva discussão, os respectivos professores decidiram redigir e aprovar o documento que, de seguida, transcrevo na íntegra, e em itálico.

. Atendendo a que, sem fundamento válido, se fracturou a carreira docente em duas: professores titulares e não titulares;
. Atendendo a que essa fractura se operou com base num processo arbitrário, gerando injustiças inqualificáveis;
.Atendendo a que os parâmetros desse concurso se circunscreveram, aleatória e arbitrariamente, aos últimos sete anos, deitando insanemente para o caixote do lixo carreiras e dedicações de vidas inteiras entregues à profissão;
. Atendendo a que, por via de tão injusto concurso, não se pode admitir, sem ofensa para todos, que seguiram em frente só os melhores, e que ficaram para trás os que eram piores;
. Atendendo a que esse concurso terá repercussões na aplicação do assim chamado modelo de avaliação, já que, em princípio, quem por essa via acedeu a titular será passível de ser nomeado coordenador e, logo, avaliador;
. Atendendo a que, por essa via, pode muito bem acontecer que o avaliador seja menos qualificado que o avaliado;
. Atendendo a que o modelo de avaliação é tecnicamente medíocre;
. Atendendo a que o modelo de avaliação é leviano nos prazos que impõe;
. Atendendo a que o modelo de avaliação contém critérios subjectivos;
. Atendendo a que há divergências jurídicas sérias relativas à legitimidade deste modelo;
. Atendendo a que o Conselho Executivo e os Coordenadores de Departamento foram democraticamente eleitos com base nas funções então definidas para esses órgãos;
. Atendendo a que este processo, a continuar, terá que ser desenvolvido pelos anunciados futuros Conselhos de Escola, Director escolhido por esse Conselho, e pelos Coordenadores nomeados;
. Nós, professores do Departamento de Línguas, da Escola Secundária D. Maria II, não reconhecemos legitimidade democrática a nenhum dos órgãos da escola para darem continuidade a um processo que extravasa as funções para as quais foram eleitos;
. Mais consideram que:
. Por uma questão de dignidade e de solidariedade profissional, devem, esses órgãos, suspender, de imediato, toda e qualquer iniciativa relacionada com a avaliação;
. Caso desejem e insistam na aplicação de tão arbitrário modelo, devem assumir a quebra do vínculo democrático e de confiança entre eles próprios e quem os elegeu, tirando daí as consequências moralmente exigidas.

Notas:

1 – Dos 22 professores presentes, 21 votaram favoravelmente e 1 votou contra:
2 – Para além de darem conhecimento imediato deste documento aos órgãos, ainda democráticos, da escola, os professores decidiram dá-lo a conhecer a todos os colegas da escola;
3 – Decidiram também dar ao documento a maior divulgação pública possível, e enviá-lo directamente para outras escolas e colegas de outras escolas;
4 – Pede-se a todos os professores que nos ajudem na divulgação deste documento, e que o tomem como incentivo e apoio para outras tomadas de posição;
5 – Este documento ficou, obviamente, registado em acta, para que a senhora ministra não continue a dizer que nas escolas está tudo calmo, e que só se protesta na rua;
6 – A introdução e as notas são da minha exclusiva responsabilidade;
7 – Tomo a liberdade de agradecer com prazer aos professores da Escola Secundária D. Maria II, Braga, e principalmente às mulheres, as mais aguerridas, pelas posições firmes que têm assumido, e por rejeitarem qualquer outro lugar que não seja a linha da frente da luta pela dignidade docente. É um orgulho estar entre vós.

8 comentários:

Anónimo disse...

Gostei muito da dos "netos".
Também hão-de levar uma rosa e piscar os olhos. Ou levarão um cravo?
Beijinho.

Anónimo disse...

A coragem distingue as pessoas. Acompanhamos o seu blogue com muito interesse.
Vamos pôr isto a circular pelo país.
Parabéns aos restantes professores que subscreveram o texto.
Estamos todos na luta e sábado é marchar!
Abraço.

Paulo santos

TempoBreve disse...

Cara Ibel:

Às vezes é prediso usar imagens afectivas fortes para iluminar a força da razão mais fria.
Quero rosas.
Quero violetas.
Quero folhas e cachos de uma videira-
:-)

TempoBreve disse...

Caro Paulo Santos!

Obrigado pelo apoio e pelo incentivo. Se eu fosse crente diria: - "Que Deus vos pague". Você perceberá a força da expressão.
Até sábado! Até depois de sábado.

António Mota

Anónimo disse...

Meu amigo,
Que as rosas,as violetas,os cravos,as folhas e cachos de uma videira inebriem todas as linhas deste texto de reflexão.Apesar do cansaço verificado nos vinte e dois rostos,não abandonámos a voz,não abandonámos o templo,até que então nascesse a «canção»!
Não esmoreçamos!A hora é de luta!
(e de luto,como disse um colega nosso)!
Até sábado!
Eduarda

TempoBreve disse...

Cara Eduarda!

Obrigado. Há vinte anos que o meu gosto pela intervenção activa estava adormecido. Acordou. Tinha que acordar. E sinto-me bem, porque a causa é justa, porque a causa é nobre. A mim é principalmente a liberdade e a democracia séria que me movem.
Vai gostar dos comentários a esta tomada de posição que estão em "A Educação do Meu Umbigo". Seria até bom que algum colega de Braga lá deixasse uma mensagem de agradecimento.
No Sábado, todos os caminhos vão dar a Lisboa.
E eu serei um dos caminheiros.
Abraço.

Elisabete disse...

Também eu me sinto ressuscitada.
Vejo este momento como essencial, que não se pode perder, para exigir uma Escola digna, de qualidade e justa.
Para os Professores e para os Alunos, as principais vítimas deste lodaçal.
Força, meus amigos!
Tenho convosco o meu coração

TempoBreve disse...

Elisabete!
O dia de amanhão é muito importante. Mas não é o dia final.
Temos que recomeçar a partir daí, com novos dados e novas formas de intervenção.
Estou com receio das provocações. Eu sei do que falo. Há provocadores profissionais que se arranjam em qualquer esquina.
Mas na manifestação estarão presentes muitas pessoas que sabem o que isso é, e que saberão agir. Mas a manifestação vai ser tão grande, que tudo pode acontecer. Seria o cúmulo. Mas você já viu a capa do Público de hoje?
Vai correr tudo bem.
Eu tenho que estar lá, embora saiba que a minha presença lá não faz diferença alguma.
Obrigado.