quinta-feira, 10 de abril de 2008

Andará a loucura à solta?*

Deixo-os aqui com O Alienista, de Machado de Assis (1839 - 1908). Tenham cuidado. A sua morte foi anunciada. Mas nunca fiar. Ele pode apenas estar a experimentar uma nova teoria sobre a loucura. Acautelem-se, pois!
Já há tempos que queria pôr este livro aqui. E até falar dele. Fui adiando. Hoje decidi-me. Ele aqui está. Mas não vou falar dele. Se o ler verá que não é necessário. Ele fala por si. E se já o leu, faça como eu: leia-o outra vez, e outra, e outra.
Como é por de mais sabido, o Machado de Assis é brasileiro, de pai português e de mãe mulata. Sobejamente sabido é também o facto de ele ser um dos primeiríssimos entre os primeiríssimos autores da Literatura de Língua Portuguesa. Disse bem: Literatura de Língua Portuguesa. Não me enganei.
Sei que há quem sustente aquela ideia peregrina de que o falar português à moda do Brasil é já outra língua. Ou, se não é, que virá a ser. Há quem sustente o mesmo com o falar inglês à moda dos Estados Unidos da América do Norte. Os argumentos também são os mesmos. Mas não têm razão.
Os peregrinos dessa tal ideia dão-nos argumentos empolados de grandes roupagens. Mas, quando despidos, não têm peso bastante. Eu compreendo-os. Baseiam-se muito em estatísticas de espaço e de gente; baseiam-se também muito na sua própria vontade, cuja grandeza é inversamente proporcional ao peso dos argumentos que apontam. Mas as estatísticas voluntariosas, regra geral, são enganosas; dão-nos aquilo que já sabemos e queremos provar; ou o seu contrário, caso mudemos de ideias. São muitas vezes um verdadeiro absurdo, uma arbitrariedade, uma caricatura. São como aqueles referendos, cujo resultado não está tanto no voto, mas está muito mais no modo de perguntar.
E onde é que entra aqui O Alienista? Não entra. Mas eu faço-o entrar. Porquê? Porque quero, e porque a sua actualidade mo permite; mas, da actualidade poder-se-á falar depois. Então, não foram forçadas as considerações acerca daquela coisa das "línguas" e dos "argumentos"? Claro que foram. Mas eu avisei, lá em cima, no segundo parágrafo que não ia falar do livro. A culpa foi sua, que não acreditou. Você não tem vergonha? Não pode ao menos apontar duas razões para a sua demagogia? Ora aqui vão elas: primeiro, o Machado de Assis é brasileiro, mas escreveu o livro em português; segundo, o protagonista d' O Alienista é um homem de ciência, e também usa a estatística.
Para terminar, que isto vai longo, volto ao princípio, que é o essencial: acautele-se, que anda a loucura à solta; e leia O Alienista, que isso é que importa.
..........
*Notas:
1 - Este texto foi deixado aqui nas Peles a 7 de Novembro de 2007; volto a deixá-lo aqui, pois, agora, juntam-se duas razões próximas à sua permanente actualidade: a loucura anda decididamente à solta no meu país; e o Acordo Ortográfico;
2 - Lembrei-me de fazer pequenas alterações para melhorar o texto, adequando-o mais a estas razões últimas; mas não as fiz: assim nasceu, assim ficará;
3 - Se tiver curiosidade, e relacionados com este, pode ler os textos Amazona e Guerreira ( publicado nas Peles a 9 de Novembro de 2007 ), e O Alienista - enredo (publicado no TempoBreve, também a 9 de Novembro de 2007).

4 comentários:

Anónimo disse...

� inquestion�vel que a loucura anda � solta e �s vezes basta olhar ao espelho.

Anónimo disse...

Quanta amargura Sr Anónimo!
Um pouco de loucura quando nos olhamos ao espelho não deveria ser salutar?

Ao Professor deixo um abraço nesta visita bem rápida, porque afinal o tempo é breve!

TempoBreve disse...

Caro anónimo:

A loucura é sempre questionável. A não ser para os que.
O título "Anda a loucura à solta?" foi-me "dado" pelo conteúdo do livro "O Alienista", como você adivinhou, certamente. Se não, leia o "Enredo" resumido que também publiquei. Basta ver as "Notas" para ver onde encontrá-lo.
Aquela referência ao espelho é uma referência muito sábia? Acontece consigo? Olhe que comigo acontece algumas vezes - vou até dizer "muitas" vezes", para você se sentir melhor, e mais acompanhado. E quando olho para o espelho e vejo alguma louvura a espreitar, fico todo satisfeito. Às vezes até me rio. Eu gosto dessa loucura. Até tenho orgulho nela. Sinal que não sou éstúpido.
Consigo deve acontecer o mesmo. Espero bem que aconteça.
António Mota

TempoBreve disse...

Olá, Fénix!

O senhor anónimo não está amargo. Deve é estar é preocupado. Não, se preocupe você.
Abraço retribuído.
:-)